31 dezembro, 2008
Receita de Ano Novo
cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação como todo o tempo já vivido
(mal vivido ou talvez sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,
novo até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanhe
ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?).
Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto da esperança
a partir de Janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um ano novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.
Carlos Drummond de Andrade (1902 –1987)
poema do velho ano novo
pena é que o amor seja lembrado só nestes dias
e que dele se fale com abundância quando a chuva cai agora
e ainda há muito frio e as guerras se aceleram
ao fechar do livro do velho ano,
para nos dizer que houve pelo menos um dia de tréguas
e acabe tudo como principia depois da neve.
pena é que só agora viva a magia de um colar de pérolas
com sua métrica e nostalgia de luz alumiando as trevas das ruas.
alimentamos o canto insonoro dos homens sem memória livre
cobrindo as mãos com o silêncio dos injustos .
e voam como mariposas da paisagem de Gaza
as romãs de sangue que floriram a toda a hora.
fazem parte do soar das doze badaladas,
quer tu queiras ou não.
não sei a quem pedir mais Paz no frágil cântaro do tempo,
reparto contigo o vinho e o pão que a terra deu este ano.
na rua silenciosa dormem os cães e os mendigos
sem uma côdea de sonho para os próximos dias do ano novo.
mais tarde adormecem na almofada macia os rostos da anestesia
no terrorismo da jaula dos dias.
pela indiferença morremos.
pela diferença somos ainda poucos
e caminhamos sobre as ondas do mar chorando para dentro dos olhos
a terra inteira
maria azenha
30 dezembro, 2008
rumi: say i am you (sufi poem)
.
com votos de um 2009 pleno de oportunidades, entre os desafios certos que aí estão,
mt
28 dezembro, 2008
Africana
A espera verde
Onde o fogo do teu Sol descera
Para beijar-te.
Foste a pureza da selva,
A seiva que regou a terra dos imbondeiros,
Onde a luz irradiou, feliz, do teu bronze,
Ao encontro das coisas que te amavam
Com seu olhar.
E dançavas, livre como teus seios,
Ao som do batuque.
E sonhavas sem ser preciso sonhar!
Mas, um dia, eles chegaram...
E te fizeram escrava.
Violaram-te
E venderam o teu corpo, amarrado,
Como coisa de mercado.
Mataram os teus amores,
E os teus beijos secaram.
Depois engravidaste
Com a dor da tua raça,
E o sémen que recebeste
Deu-te a alma que geraste.
Ninguém a pode comprar!
Ninguém a pode vender!
Mas é preciso sonhar...
Tens de aprender, outra vez,
Porque agora é preciso!
Mesmo que seja a lutar
De flecha, fuzil ou canhão.
E um dia amanhecerás,
De novo,
Com teu Povo,
Com teu Povo pela mão!
poema de Sérgio O. Sá, in VERSOS NA GUERRA - VERSOS DE PAZ, 1971.
24 dezembro, 2008
23 dezembro, 2008
22 dezembro, 2008
Um dia será NATAL
.
21 dezembro, 2008
O MUNDO ...
no rosto de um fuzil de uma boca presa a nada, só gatilho, estaca, ventre
O mundo mergulha os ares, o traço de aviões, o que fumega, estrebucha e cai
É ruído de sangue insolente, frio como as olheiras de um doente
deleita-se com a gaze e com as contas correntes, o saibre antigo
o alçado da velha casa, a sã ponte quente, inteira só por dentro
Mergulha nos sentidos na púrpura de bronze de ferros e de vidros
nos velhos testemunhos dos vorazes senhores, pasmo de todos os ouvidos
Ao mundo não falha lágrima, a precisão do cronómetro, a negociação com os sentidos
o estertor e o gado inesperado à doença do dia, o podre da noite, a bala fria
à cabeça o arremesso, a neve árdua refracta-se e esvazia
O mundo dá sementes de cólera, vasos dilacerantes no sangue
prende olhos, estanca gritos, encontra rastos, espia
O mundo, o grande estertor que sabe na boca à grande casa de morrer a morte
ou ao sobressalto quando se faz da primavera um só dia
O mundo ergue-se na tábua, na vala funda, na dorida lágrima, na inatingível morte
não há quem espreite um coração inteiro, quem queira um rio de fogo branco
a música mais bela apodrece com a cativa alegria, e são só nós os desencantos
por entre as flores dos anjos que queimam de lume as manhãs
de muitas horas
e por isso se cala na rua quando os reis se levantam e proclamam
amortalhámos Tebas:
lavámos as mãos num poço mais fundo do que os olhos, lavámos o rosto nas águas mais inóspitas das terras ermas onde ainda gorjeia de sorriso uma criança;
parida nesta esquina com o mundo, o nosso mundo de frente e do avesso
O mundo que nos abandonou não se esqueceu da receita e devolveu-nos o preço
José Ribeiro Marto
natal
........................................ o deus
........................................ mortal vencedor da frigidez da carne
senhor
da palavra
a desafiar o vento
frio
chuva
neve
ou
o velho
inserido a vermelho e branco
na cama do tempo
ei.lo
senhor
aquém
do conhecimento
pai
perdoa.lhes porque não sabem o que fazem
o menino projectado em redondo
pressagia
um olhar preso ao chão ou
à coroa de espinhos que
oscila em fim de vida
sobre a cabeça
suspensa no enfado dos
que o conduzirão à morte
dentro dele a chuva ácida cede
lugar ao engodo e
a História insiste
no vermelho e branco
saído em encanecidos laudatórios
ei.lo
o homem.... novo
deus
mortal
vencedor da frigidez da carne
o actor nato
da ceva
............. engordando
....................................................... No natal
....................................................... .
....................................................... .
....................................................... .
....................................................... .
....................................................... os meninos estropiados
....................................................... compram
....................................................... a fome
20 dezembro, 2008
17 dezembro, 2008
abre o meu coração
abre o meu coração
nele encontrarás o verde pulsar
da súplica clandestina dos versos que não disse
porque os escrevo em todas as manhãs bem cedo
nos espelhos
na justeza dos girassóis
que urgência trago aqui ?
que trajectória ?
que preciosíssimas ilhas?
o mundo é dos pássaros.
mariagomes
17dez, 2008
16 dezembro, 2008
salvíficos 1, 2, 3, 7
.
sangrar o bezerro
salvar a alma, o ouro
sentimento instante
.
gerar cada.
momento
.
2
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simples, é, para a humilde
interior suave voz
silenciosa
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beijar o fogo.
é.
da alma alumiada
.
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dobrar a esquina da rua a lápis quebrada.
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da lata para a tela virtual.
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essa: o mosto.
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15 dezembro, 2008
14 dezembro, 2008
Partes
partes já colheste da manhã dois raios de sol
já contaste as gaivotas pousadas nas mesas
já sabes o indecifrável do seu voo
as manhãs rebeldes
as partes em que divides as tristezas
partes por entre os olhos que correm distâncias
moves as pálpebras inclinas a cabeça e esperas
agora sabes menos do vento em muitas tardes
quando giram vermelhas as esferas
sabes mais do frio sabes mais do vento
das gaivotas pousadas sobre as mesas
do tempo em que divides as coisas várias
e recontas ponto por ponto as tristezas
com um relógio frio pulsando o árido
olhas as tuas mãos trémulas e defesas
não s uportas a prisão do contar
nem os mundos vários que sopesas
José Ribeiro Marto
13 dezembro, 2008
12 dezembro, 2008
aos Poetas da III Bienal de Poesia de Silves......com saudade!
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agrada.me conceber a beleza e a ternura .serei capaz?
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Nas Vagas do Tempo
dos relâmpagos, flor alucinada, pousada entre os ventos.
Nas metamorfoses do silêncio, nas nervuras do céu,
penetro e habito, nos nervos do sílex pernoito,
nas giestas habito, nas flores amarelas,
nas ramagens aéreas, é que o meu cérebro se espraia
e o meu corpo refulge, se estende e dormita.
Trepanando a tépida imensidão, a urgência do sol circula,
em ondas verdes, em ondas brancas,
em substâncias fendidas, em areias esquecidas,
em palmeiras lunares, descobertas em paraísos distantes.
Entre os desertos e os oásis, o destino da água desenha,
nos remos de neblina, o lugar onde as palavras constroem
de novo a espiral de bruma, a chama, a sede,
o azul e os violinos.
Na salsugem marinha, no leito dos rios, nos limos,
nos cardos, habita o fogo, a ruína, a transparência.
No imenso ardor que guarda a febre e os murmúrios,
a vertigem de espuma desperta, nos casulos do nada,
a carícia exacta que flutuou, um dia,
no selo luminoso das vagas do tempo.
Maria do Sameiro Barroso,
in Revista Saudade, nº 10, Junho, Amarante, 2008, p. 45
11 dezembro, 2008
(não são um fotopoema mas estas letrinhas entregam...
.
FOTOPOEMA
10 dezembro, 2008
há lembranças que matam
há lembranças que matam.
há bosques onde os amados vivem para sempre.
há um cutelo de água nas fontes
que separa a luz cega das lágrimas,
quando as palavras voam para muito longe.
há a noite
e os cães que dormem em cordas de sono,
em vogais de vento e abandono.
há barcos que deslizam no horizonte,
muito lentamente,
e as estrelas descem por dentro dos mastros
na noite.
há uma orquídea azul que se suicida
onde começa o teu nome.
há um relâmpago martirizado em meu peito de cambraia
que teima brotar laranjas de fogo.
há um peixe alucinado que canta
desmedidamente,
em um céu de cisternas e serpentes.
é dezembro. e os girassóis recolhem-se para dentro
de um rio vermelho
- atravessam meu peito de agonia e ouro -
rasgam lenços de sede em minha casa de Oriente
há sinos de sangue em molduras de sombra e vento
nos muros da luz.
o Sol ilumina um jardim oculto
que te transforma em fonte
maria azenha
09 dezembro, 2008
07 dezembro, 2008
FOTOPOEMA
Os amigos.
ponto pérola de encanto
girassóis que nos acendem o sol
como interruptores de salvação
plantações africanas de algodão doce
que adormecem a paisagem das lágrimas
atravessam savanas devastadas
serpentinas de vento
desolação
na vaga recordação da cor que há
em cada sombra de tristeza.
É assim que tu és
entre todas as noites do planeta
a mais acesa quando as estrelas desenham
o caminho das palavras num avião de papel
branco como a farinha das pétalas
arrancadas a uma primavera
e com ele desenhas um búzio de som
que enfeitas no espaço com as mãos
onde me recolhes num abraço frágil
como a noite em que me encontro agora
mesmo quando é dia e o sol já se aclamou no horizonte.
Lembro-me de quando disseste o meu nome
como se pudesses acreditar
que eu era poeta
de palavras ideias e imagens
escondidas em cada folha de pele
atrás um mural de sorrisos inquietos
os deuses implacáveis prestavam-se a julgar-me
e tu salvaste-me com o olhar
e acreditaste no princípio do nome
na evocação das coisas proibidas
que eu partilhei como estilhaços de granada.
Lembro-me das tardes
em que esgrimimos as palavras do poema
e juntos tornamos menos só
a arte de dizer o crime com propriedade
sem medo incendiando a verdade.
Temos medo
das doenças dos amigos
como de fósforos na mão de uma criança
sem eles desistimos de acrescentar um rio
descaracterizamos todo o esqueleto
de imagens que são o nosso eu mais fundo
de aprender o que acontece
depois da nossa idade.
Deixamos de saber exactamento como acontecemos
sem palavras de infinito a ameaçar o puro inferno
dos dias que os pássaros transformam
no limiar da esperança.
Nesse lugar
voamos com os amigos
para dias que não queremos habitar
por um instante
onde quer que sejamos
não seremos tão sós
a subverter o infinito.
Graça Magalhães, Dezembro 2008
POESIA
Havia uma flor
Que cheirava bem
Linda como o Amor
E de manhãzinha
Dançava e cantava
Como uma bailarina
E ao meio-dia
Quando o Sol chegava
Ficava ali e iluminava
As suas lindas pétalas
As suas pétalas
De um perfume invulgar
Eram transparentes como o ar
Porque ao Luar não se viam
Eu gostava de ter esta flor
Que é linda como o Amor
E cheira bem
Mas só existe na imaginação
De alguém com o coração
Cheio de Amor!!!
04 dezembro, 2008
3ª série . photoetrys temáticos//desconstruções
fotografias e ilustrações de vários autores,
desconstruções escritas e manipulações de gabriela rocha martins.
veja aqui as construções.
03 dezembro, 2008
AS UVAS DE LABÉRIA GALA
02 dezembro, 2008
dantes um poema ardia dentro de ti
como uma expressão cabendo descalça
alagava-me os lábios
queria também que nesta terça-feira dia 7 de Fevereiro
não houvesse sirena única que me dissesse
o mar bateu cem vezes em vezes por ti chamou
os pescadores foram à terra degolar a fome
porque na terra pai as alvas dilatam a memória
e agora a memória está outra vez a bater no mar
contra o silêncio das coisas obscuras.
mariagomes
Coimbra, 7 de Fevereiro de 2006