28 março, 2008

Maria Toscano

nasceu Alentejana de Campo Maior, no mês de Maio e tem sido tecida pelos laços que faz, desfaz e refaz; pelos espaços que a marcam ou habita/m (Abrantes, Ilha do Sal-Cabo Verde, Águeda, Alentejo, Lisboa, País Basco e Coimbra), e pelos sonhos que arrisca, desde jovem, investigando os territórios da expressão e da criação pela arte: TEUC, 1980; IBIS - Teatro Universitário – ISCTE; Núcleo de Expressão Dramática da AEISMT – 2001-2002; direcção artística da Oficina de Teatro Universitário do ISMT, com ritmo incerto de trabalho, desde Abril/2003; animação de bares e restaurantes de Lisboa e Coimbra – anos 80/90 (música popular portuguesa e brasileira, fado; criação de espectáculos de cafés-concerto - canções de Piaf e textos próprios; convidada por Natália Correia para interpretar canções de Piaf na tertúlia de 8 de Março/1991, no Boutequim); canto, pontual, do Fado de Lisboa, desde 1993; canta no livro-cd «Poemigas. Versos y Canciones (Espanha, «del Lunar», col. Del Nagual: 1998).
Tem, publicados, sete livros de poesia (Minerva de Coimbra, Palimage Ed., e Pé de Página Ed.) e algumas Antologias ou Colectâneas de poesia integram textos seus (Coimbra Encantada, 2003, Pub. D. Quixote); e, no prelo (Pé de Página ed.), a sua tradução do conto argentino de Silvia Longohni: “A Árvore das Flores Amarelas”. Tem, por editar, onze livros de poesia; um texto de crónicas poéticas; uma colectânea organizada de textos dispersos dos anos 80, 90; e uma colectânea de sonetos (2003).
Desde 1997, tem criado sessões de poesia – que classifica de rituais poéticos de modo a diferenciarem-se da prática declamatória: fundando-se no cruzamento de téc-nicas teatrais participativas, tem vindo a experimentar abordagens da poesia que impli-cam a / e dependem da participação do público, sempre entendido como parceiro activo e interlocutor (p.exº: Animação nocturna na Alta de Coimbra, 15/ Nov./ 1997; «Poesia Torguiana – uma nova dependência tóxica» - poesia de Miguel Torga com Joaquim Basílio (sessão: foyer do TAGV, Coimbra, 1/Fev./2000; e todas as apresentações dos seus livros).
Paralelamente, na vertente profissional, é Socióloga. Ensina no Inst. Sup. Miguel Torga (Coimbra) desde 1990, investigando, actualmente, sobre os processos de requalificação social de mulheres designadas como pobres.
autora dos blogues Sulmoura , EmedeAmar [clique]
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«convoco-te…»


convoco-te, uma vez mais, Serenidade!
.
te invoco e desejo. intercedo:
.
..
que o sal da paixão conserve os sais
.
do futuro enredo.
.
..
já libertos
refaçamos nossas casas
facetadas salinas
de cristais.
.
.já libertos
temperemos nossas vidas com Sinais.
.
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a mansa mão do canto

2.
abre-se o universo
aquietado
pelo espasmo vital que se anuncia.
.
gérmen do nunca silenciado
argumento do impossível vencido

abre-se o espasmo.
.
e o vital nos guia.

6.
quero o laço a côdea o miolo
e a cereja
de leite ungida.

11.
hei-de ir beber à fonte desse poema
a sílaba que me abre em palavras.



27 março, 2008

Maria Gomes

nasceu a 8 de Junho de 1958, Angola.
autora do blogue Romã (A) de Vidro [clique]

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o pirão das lavadeiras

esta noite sonhei que comia, como antigamente,
em bolas, o pirão das lavadeiras.
lambuzava as mãos no molho da lata assente no fogareiro.
meu corpo de menina aquecia sentado numa pedra de luz,
vinda do sol que secava o peixe para a banda sul das pescarias.

sonhei com esses dias de gozar, na estrada estreita sem palmeiras,
ladeada por morros e mar. o mar que me batia!
(lembras-te, pai, do medo que eu tinha do mar?)

e sonhei também com os olhos abertos das cubatas
que sem pestanejar, me deixavam ver o escuro de pupilas.
de pupilas que não liam, mas sabiam, e arregalavam-se aos
desenhos das nuvens e futuras trovoadas…

no meu sonho voltei a ser menina, comi o pirão das lavadeiras
e revi a insónia nos olhos das cubatas.

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Outrora eclodiam os desertos.
Chegava a integridade de um outono -

a seiva, àquela simples casa que morria
de súbito, e amava.



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esta voz que persegue como a pedra
que te escreve
esta voz ecoa no caminho
no que foi ternura
flor
luar
clausura

piano dentro da palavra.

26 março, 2008

Maria Estela Guedes

Membro da Associação Portuguesa de Escritores, da secção portuguesa da Associação Internacional de Críticos Literários, do Centro Interdisciplinar da Universidade de Lisboa e do Instituto São Tomás de Aquino. Directora do TriploV (www.triplov.org). Alguns livros publicados: Herberto Helder, Poeta Obscuro; Eco/Pedras Rolantes; Crime no Museu de Philosophia Natural; Mário de Sá-Carneiro; A_maar_gato; Ofício das Trevas; À la Carbonara; Tríptico a solo; A Poesia na óptica da Óptica. Espectáculos levados à cena: O Lagarto do Âmbar (Fundação Calouste Gulbenkian, 1987); A Boba (Teatro Experimental de Cascais, 2008).
Directora do site triploV [clique]

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ESTUDOS PARA “SEBASTIÃO”

A COROA

Regressas… É a hora, agora.
De um ofício de corpo presente?

Por te amar in absentia
O peito me cobriram de sangue
Os sagitários romanos.
Sebastião, meu Sebastião!

Nas areias deste areal contas
Pelo rosário que te rezo
Com Deus à escuta nas ondas
Lendas de monstros meninos…
Cruel o nosso fado! A tua virgindade
Coroa-me o pénis com espinhos
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O DESEJADO

Dizem que sou o Mártir, mas não…
Eu sou o grande mar Atlântico
Desejo que por vagas nos conduz
Aos cimos do amor que te tenho…

Dizem que sou S. Sebastião…
Eu sou o que às Portas de Hércules se detém
O nome saboreando à oliva e ao figo seco
Para te amar aqui, além de Além.

24 março, 2008

Maria do Sameiro Barroso









nasceu em Braga, em 12 de Maio de 1951. É licenciada em Filologia Germânica e em Medicina e Cirurgia, pela Universidade de Lisboa. Tem os seguintes livros de poesia publicados: O Rubro das Papoilas, Rósea Litania, Mnemósine, Jardins Imperfeitos, Meandros Translúcidos e Amantes da Neblina.
Tem colaborado em antologias, revistas literárias, encontros de poesia, tendo integrado a II Bienal de Poesia de Silves, 2005 e apresentado livros de poesia. A partir de 2002, a sua actividade alargou-se à tradução, ao ensaio e à história da Medicina.
Foi coautora do livro Mozart e os Mistérios Iniciáticos, com José Manuel Anes e Paulo Loução, tendo traduzido o libreto da Flauta Mágica, a partir da edição facsimilada de 1791. Integra, desde 2006, o Conselho Editorial da Editora Labirinto.


Colaborações esporádicas no blogue Palácio das Varandas (clique)


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FÁBULAS, IMPRESSÕES, MEMBRANAS

A água, a flor e o lume, as variações do hipocampo,
a Estela Guedes falando de Herberto Helder.
Estávamos em Silves, a noite era fria, a aragem límpida,
o vento lúcido.
Ao longe, um incêndio.
Nas golfadas de aroma, a noite primitiva e só respirava,
entre a sílica e o açúcar,
num longo canto, onde o odor se inclinava,
em montanhas claras, hialinas.

Nas têmporas, a luz irradiava.
Nas grandes árvores do cérebro, a ânsia era a seiva e a flor,
sobre os muros cálidos, brancos, as glicínias amenas,
e as buganvílias exuberantes.
Nas variações da lua endógena, a terra era o cântico,
o fulgor, o oceano do sangue.
A água era a fonte, onde os leões bebiam a sua sede,
a noite era um violino.
Ao longe, um deserto brilhava, entre âmbar, rolas,
neblinas, canteiros verdes.

Nas galáxias da escuridão, as palavras irrompiam,
longas, como fábulas.
Num copo cheio de música, a poesia era um ancoradouro
branco, na Fábrica do Inglês,
entre artefactos de cortiça e a maquinaria antiga.
No silêncio, coberto de limões repletos, o céu floria.

Entre o hipocampo e a amígdala, o vento era roxo,
a noite fria.
Nas metáforas da seiva, as metáforas da vida,
os hibiscos de lume,
a lua coberta de crateras, órbitas fendidas,
aquedutos brancos.
No cérebro, em pedúnculos de sílabas,
oscilavam membranas cor de pérola.

26-4-2005


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SILVES

Al Mu’tamid traçara-lhe o destino, a rota do Sul,
as cores fortes, a fronte clara, a herança mourisca.
Dois dias depois, uma a uma, guardo todas as suas pétalas,
os seus ramos altos, as suas reminiscências odorosas,
os seus átrios de luz e poesia,
Nos seus rios, correm lendas antigas, desdobradas
em murmúrios ávidos, incendiados junto às laranjeiras
abertas, em suas copas de magia.

Dois dias depois, recordo a sua igreja, o seu castelo,
a sua terra vermelha,
o Foral que lhe concedeu a liberdade.
No seu hálito fulvo e branco, há cálices, redomas
onde a palavra arde e o silêncio urge.
Nas ruas, há relatos, centelhas, clamor, memórias claras,
fruto e seiva que se desprende das árvores
e das libélulas inebriadas, sobre espáduas
de harmonia.
Sobre clepsidras antigas, recordo
as fontes, as gentes, os dias floridos,
sobre candelabros flutuantes.

19 março, 2008

Marco Alexandre Rebelo


nasceu em Moçambique em 28-1-1976.

Mestre em Estudos Portugueses – Teoria da Literatura pela Universidade Nova de Lisboa, com a dissertação O Espaço sem Volta: dos Pequenos Poemas em Prosa a Os Passos em Volta, Lisboa, FSCH, 2005. Licenciado em Jornalismo pela Universidade de Coimbra. Autor do livro Nietzsche, Pessoa, Borges: Por trás das máscaras (in)voluntárias do acaso, Lisboa, &etc., 2004.
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Selecção de Marco A Rebelo
O AMOR DE ARTHUR RIMBAUD
O MESTRE DO SILÊNCIO


Na montanha onde moram as estrelas
bosques que existem há mil anos
de cabelos negros como o luar e a brisa da tarde
quando entra branda entre as pétalas das flores
que se inclinam sobre o morto que dorme
e misteriosamente repete:

«Sur l'onde calme et noir où dorment les étoiles
un chant mystérieux tombe des astres d'or»
semi-saído da terra com um olho infinito aberto
morto há um ano ao nascer da lua
morto há um dia ao nascer da rosa
morto há um sonho, morto há um gesto
frente ao sopro das árvores da noite
tocou o seio infante numa primavera
e misteriosamente repete:

«Ó pâle Ophélia belle comme la neige!
Ciel, Amour, Liberté: quel rêve, ô pauvre folle»
transparente sobre a terra mole de lava de estrela
sobre cabelos idênticos aos dos mortos desolados
morto há mil anos repete:

«La blanche Ophélia flotte comme un grand lys»

o morto misteriosamente diz:

«Il y a une horloge qui ne sonne pas»

António Maria Lisboa
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O DISPOSITIVO MALDOROR-POÉSIES


Vejam as condições da vossa vida intelectual tal como são e não subestimem o medo.

São hoje bem raros os especialistas capazes, sem aqui perderem a razão, de fabricar para se fornecerem a si mesmos os livros que têm inveja de ler, as palavras de que têm necessidade.

Mais raros ainda aqueles que, para fazê-lo, se contentam com a pequena ferramenta-mínima: o alfabeto, o Littré em quatro volumes e algum velho tratado de retórica ou discurso de distribuição de prémios.

Mas por mais que possuam outros livros, torna-se indispensável ter o poder de neutralizar o efeito à necessidade.

Não foi acaso que em 1870, altura de uma terrível humilhação francesa, um pássaro de enorme envergadura, espécie de grande morcego melancólico, de condor ou vampiro dos Andes — um grande pássaro membranoso e ventilador —, veio empoleirar-se na rua Vivienne, no bairro da Biblioteca Nacional que ele não pára de sobrevoar desde então, de planar olhando como um abraço ameaçador e tutelar ao mesmo tempo, fazendo as suas voltas ao crepúsculo, com o barulho de uma bateria, no céu sepulcral da burguesia.

Ajuízem os avatares que ameaçam o vosso espírito à imagem daqueles que sofreu a nossa literatura nacional.

É preciso que aquilo lhe chegue, esta cãibra da mandíbula! e, na mesma ocasião, o endireita capaz de a resolver.

Tirem proveito desta lição. Equipem a vossa biblioteca pessoal com o único dispositivo que permite que a vontade afundar-se e voltar a flutuar.

Assim, imaginemos que, a seguir a não sei que leitura, chora no vosso coração como chove na cidade ou que, pelo contrário, se sintam ao mesmo tempo febris e amorfos como se tivessem apanhado muito sol…

Abram Lautéamont! Eis toda a literatura voltando como um guarda-chuva!

Fechem Lautréamont! E tudo, imediatamente, volta ao lugar…

Para desfrutar no domicílio de um conforto intelectual perfeito, adaptem à vossa biblioteca o dispositivo MALDOROR-POÉSIES.

Aprendam e façam com que a vossa família aprenda a forma de se servirem dele.

…É aqui que, por hoje, se ficam os nossos conselhos.

Francis Ponge, “LE DISPOSITIF MALDOROR-POÉSIES”
(Tradução de Marco Alexandre Rebelo)

18 março, 2008

Manuel Madeira

nasceu em Messines, Silves, em 1924. Deslocou-se com a família para Faro e depois para Olhão onde fez estudos secundários. Foi empregado no Comércio e funcionário da Fazenda Pública, tendo sido demitido por motivos políticos. Foi preso e torturado pela PIDE várias vezes. Trabalhou finalmente como técnico da indústria agro-alimentar durante cerca de trinta anos. Colaborou com poesia e ensaio em publicações clandestinas nos anos 40 do século passado e posteriormente em jornais e revistas literárias. Figura na Antologia de Poesia Portuguesa do Pós-Guerra, 1945-1965, Editora Ulisseia. É co-fundador da revista «Sol XXI», tendo colaborado com poesia e ensaio. Reuniu em livro parte da sua poesia, de 1949 a 2004, sob o título «No Encalço do Real Inalcançável», Editorial Minerva, Lisboa 2005. Em 2007 publicou «Um Pouco de Infinito em Toda a Parte», Editora Atelier e em 2008, «Cartas Poéticas entre António Ramos Rosa e Manuel Madeira», Editora Labirinto.
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Tempo do Poema


O poema é um universo de letras
como o universo é um poema de partículas
surgidas em conjunto com o espaço e o tempo
a partir da matéria que sempre existiu com formas diferentes
atingindo o ponto culminante da grande expansão
de estabilidade assimptótica intuída pelo cérebro que a concebe,
resiste e se adapta às maiores convulsões
e está presente aqui e agora para dizer o que pensa e sente
de olhos fechados tentando reproduzir em palavras
o que ele não vê com os olhos abertos
susceptíveis de criar as maiores ilusões.

Nem sempre o poema começa pelo princípio
como teria acontecido com o universo
ainda que nos custe aceitar o paradoxo,
quando a realidade é que antes de antes
existe pelo menos o infinito, onde tudo, potencialmente se afirma,
que não precisa de palavras para existir,
porque elas só surgiram quando quase tudo existia,
com letras e sílabas à deriva nos neurónios
e fotões e bariões no espaço-tempo a esmo
mesclado de caos e de organização
onde a ordem e a desordem são palavras de ordem
que se revezam de acordo com a dinâmica das coisas
à medida que elas se transformam talvez
num vai-vem indizível de eterno retorno
porque nada nasce de nada e tudo tem origem que pode ser original.

O tempo preexistiu em estado virtual
como o poema existiu antes de existir,
ambos dispersos na massa anónima das probabilidades
nos circuitos invisíveis da matéria plausível
onde os conteúdos casualmente contendem em busca de uma forma
para nela desabrochar germinando o fruto.
Também o poema germinou no âmago do tempo
porque sem ele teria sido um nado-morto, ou não teria existido.
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A Tesoura Falante

Era de minha mãe. Conheço-a desde que me conheço
e assistiu sem o saber ao despertar das minhas diabruras.
Neste sentido é mística, mas é para todos os efeitos
uma mística metálica. As veias são veios de molibdénio
para tornar inoxidável o que seria
perecível pasto de ferrugem
e os neurónios subsistem para alimentar
o fluxo inesgotável de recordações
no vai-vem contínuo dos acontecimentos
amontoados no cesto da costura.

Fala quase sempre a sós comigo
se lhe falta tecido para deglutir.
Adora ouvir a sua própria voz
mas tem a consciência de não ser autista
e nunca mastiga as palavras que não pode engolir
já que as quer possuídas de pleno significado
de modo a suportarem o princípio da contradição,
única fórmula aplicada de as considerar válidas
e por isso resistentes à poluição do silêncio
que não seja o silêncio pejado de sentido.

É uma velha tesoura que perdeu o brilho superficial
em troca do esplendor invisível que interiorizou,
sensível ao olhar e ao tacto de quem ausculta
o real para além das aparências.
Com ela dialogo quando o sol se apaga
e a luz dela surge ofuscando a lua
reduzida a talhada exausta de melão de inverno.
E ela fala-me longamente então
da sua experiência viva do passado morto,
do alvoroço tímido das mãos de minha mãe
pressionando o eixo, embotando o gume, mastigando o pano
lesto transformado em produto acabado com alguns alinhavos
seguindo à risca o risco traçado
pela anónima geometria das dificuldades
à luz de uma chama de candeia
suspensa sobre a mesa como o sol no zénite.

Hoje, que o sol se apagou
a tesoura só corta as palavras que restam
para acender com elas o poema.

17 março, 2008

manuel a. domingos

(1977) nasceu em Manteigas. Publicou, em 2002, o livro Entre o Silêncio e o Fogo (poesia), pelo Aquilo Teatro (Guarda). Foi colaborador do DN Jovem e da revista Rodapé (Biblioteca Municipal José Saramago – Beja). É colaborador da revista on-line de micronarrativas Minguante (www.minguante.com). Tem colaboração dispersa em várias revistas: Praça Velha (Guarda), Palavra em Mutação (Porto), Sulscrito (Faro) e Big Ode (Lisboa). Está representado na antologia de micronarrativas Contos de Algibeira (Porto Alegre, Brasil). É co-autor (com António Godinho) da peça de teatro Eu queria encontrar aqui ainda a terra, com estreia marcada para 2008 no Teatro Municipal da Guarda.


autor do blogue meia noite todo dia [clique]


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Na praia os óculos de sol dão jeito


Faria de ti
a minha musa
não fosse a tua pose
de nariz empinado.

Mas tens mamas rijas,
cu arrebitado.

E na hora
de escrever o poema
isso faz
toda a diferença.


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Acabaram com a lotaria


Acabaram com a lotaria
agora que Sernella Andrade
a apresenta em directo
na televisão
toda sorrisos
e dentes brancos.

Já não se ouve
a voz cantar

CIIIINCO MIIIIL CONTOS!

Mas isso
pouco importa.

Só não gosto
do nome
da apresentadora.

14 março, 2008

Luís Serrano

nasceu em Évora em 1938. Licenciado em Ciências Geológicas (UC). Estudos especializados na Universidade de Bordéus e em Madrid (CSIC).
Assistente da F. Ciências da UC (1967-1970), geólogo da Direcção-Geral de Minas (Porto, 1970-1975) e Investigador da Universidade de Aveiro (1975-2001). Entre 1996 e 2001, responsável pela coordenação cultural desta Universidade.

Nota bibliográfica

Colaboração dispersa em diversas páginas literárias (Região Bairradina, O Primeiro de Janeiro) e revistas (Vértice e Letras e Letras). Representado em várias antologias.
Foi um dos fundadores da revista de poesia Êxodo (1961).
Obras publicadas: A Taça e o Brinde in Caderno de Poesia Êxodo (Coimbra, 1961), Poemas do Tempo Incerto (Vértice, Coimbra 1983), Entre Sono e Abandono (Estante Editora, Aveiro, 1990), As Casas Pressentidas (edição de autor, Aveiro, 1999, uma das obras premiadas com o Prémio Nacional Guerra Junqueiro) e Nas Colinas do Esquecimento (Campo das Letras, Porto, 2004).
É ainda autor da tradução de Dieu Face à la Science de Claude Allègre (Gradiva/UA, 1998).
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ELEGIA PARA EUGÉNIO DE ANDRADE

Partiste
quando a primavera
se despedia

Quem cantará agora
as cigarras as dunas ermas
o mar a música do vento
nas searas?

Na Póvoa da Atalaia
as cegonhas
passam ainda

perguntam apenas
por essa água breve
que de ti resta
sobre a planície

São lenços caídos no céu
essas aves

mesmo se a neblina
lhes perturba
a roda do entardecer

Só nelas digo
se abre o pranto dos versos
que nos deixaste

inédito, 2005
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Espera

Esperava
que o Sol brilhasse
que a chuva caísse
que o milho nascesse

que as ovelhas
acendessem
a pele sempre lisa
dos prados
com o sopro breve
das campainhas

que os filhos
chegassem da escola
a mulher cortasse o pão
renovasse o vinho

Agora
para ele
o tempo não tem
mais sentido

e só a morte
fidelíssima
continua à sua espera

in Nas Colinas do Esquecimento, 2004


13 março, 2008

José Ribeiro Marto

nasce no dia 3 de Abril de 1960 em casa da bisavó paterna entre o concelho da Moita e o de Palmela
Estuda Sociologia no ISCTE
Faz uma Pós -Graduação em Escrita Literária na Universidade Lusófona
Ganha em 2007 o 1º Prémio Litterarius de Poesia com o poema “PASTOREIO” e uma menção honrosa com um conjunto de poemas “ERRAR” promovido pelo Clube Racal de Silves
Foi professor do Ensino Secundário
É professor de Português como Língua Estrangeira
Autor do blogue profanus [ clique ]
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O QUE LAVRA O CINZEL SENÃO A PEDRA

O que lavra o cinzel senão a pedra
com a mão buscando o nome do sangue e do escopo
com a veia escurecida vibrando na pele o pó branco
os olhos divididos entre as mãos e o som
aquele ferro presente criado na corrente
de uma imagem de tronco sobrelançado
à escuridão ou à frescura de uma mão

nada descura tão feita de seda a pele
como se fosse de madeira
e os cabelos fossem lavas brancas
cheios de fogo de ondas indo abraçar o mar
a escultura já feita impoluta
procurando a escuta de quem com ela
quisesse falar
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AH OS VELHOS COMO DEITAM CONTAS AOS DIAS

Ah os velhos como deitam contas aos dias
como lançam a danação de uma carta de sobrancelha
ao parceiro de jogada
como rebatem a vida sobre o tampo de uma mesa
como desaborrecem a morte
como só depois vem o poder de uma dor
combatida pelo ruído de uma máquina
pelos pássaros das gaiolas
pelos gatos nos beirais das janelas
ou na franquia dos muros
tudo o que lhes é silencioso é escuro
tudo o que ouvem já não pertence ao mundo
só a noite o sono o soporífero o amuo
Ah o gosto posto nos rituais nos festejos
o tiro que arremessam ao passado
contado até que adormeçam a morte
ou a criem transparente nos nossos olhos

12 março, 2008

Jorge Fragoso




(Beira, Moçambique, 1956). Licenciado em Filosofia. Editor. Membro da Oficina de Poesia – curso livre da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e sub-director da Revista Oficina de Poesia. Investigador associado do CES – Centro de Estudo Sociais, de Coimbra, no Projecto "Novas Poéticas de Resistência: o século XXI em Portugal". Livros publicados: Inima, (poesia), Coimbra, A Mar Arte, 1994; O Tempo e o Tédio, (prosa-poética), Viseu, Palimage, 1998; A Fome da Pele, (poesia), Viseu, Palimage, 2004; Rua do Almada (contos), Coimbra, A Mar Arte, 1995 e Dez Horas de Memória (romance), Viseu, Palimage, 1999, traduzido e publicado em Itália, com o título Dieci Ore, Nápoles, NonSoloParole Edizioni, 2006. Participação poética dispersa em revistas e colectâneas em Portugal, Espanha e Brasil.


co.autor do blogue SarauDosDanados ( clique )

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** (o sangue)

ergue a voz no movimento das harpas
melódico o espasmo das lavas surdas

os ossos como lâminas
soltam o chão tocam a ária
dobram a cintura sobre as garras
tocam o sangue


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** (a fome)

há um hábito de pássaros
a repulsar as linhas dos sentidos
apagam-se no branco fresco da sombra

disseram-me que esquecesse
o roxo dos lábios o gelo da pele
e a luz sólida interior ao vidro

afinal o tempo é tão absoluto
como a fome

10 março, 2008

João Rasteiro


(Coimbra - Portugal, 1965). Poeta e ensaísta. É sócio da A. P. E., membro do Conselho Editorial da Revista Oficina de Poesia e da revista brasileira Confraria do Vento(versão impressa). Tem poemas publicados em várias Revistas e Antologias em Portugal, Brasil, Colômbia, Itália e Espanha e poemas traduzidos para o inglês, francês, espanhol, italiano e finlandês. Publicou os livros de poesia, A Respiração das Vértebras (2001), No Centro do Arco (2003) e Os Cílios Maternos (2005) e O Búzio de Istambul(2008). Obteve vários prémios, nomeadamente a Segnalazione di Merito no Concurso Internacionale de Poesia: Publio Virgilio Marone(Itália-2003) e o 1º prémio no Concurso de Poesia e Conto: Cinco Povos Cinco Nações, 2004. Em 2005 integrou a antologia: “Cânticos da Fronteira/Cánticos de la Frontera (Trilce Ediciones – Salamanca). Em 2007 participou nos VI Encontros Internacionais de Poetas, organizados pelo Grupo de Estudos Anglo -Americanos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Mantém o Blogue: http://www.nocentrodoarco.blogspot.com/
autor do blogue No Centro do Arco [clique]

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as-Shilb


Já te foi tão próxima essa morada de leões e de gazelas
junto à gafaria, a solidão das fronteiras
onde o sussurro do branco se corrói
exercitando-se horto no coração transmudo
das mulheres níveas e morenas.

Hoje sabes que o mistério da luz açoita os olhos
até que o canto de al-mutamid corra o interior das gusas
que alimentam tendões de colos cortados
batendo por dentro das bocas para ostentar a flor
mas nada te preencherá a cegueira
das fábulas na margem do arade
a taifa rebelde rasgando a intimidade dos deuses
pela insídia da cor da terra e dos espaços ermos.

Frutificarás então artéria sísmica
do amarelo envelhecido e que alumbra ancestral
em opulência de imprevisíveis astros
que irradiam um cheiro a tâmaras nocturnas
sob a sede guardada em casulos abertos nos lábios do sal
um espaço errático igual aos meandros da água
o sulco da pedra como um covil
em que o poeta acúleo tangia cordas de alaúde.

Quem guardará na cozedura sublime dos fornos
a cintilação das pequenas ruas na perfuração das muralhas
que se tornam uma mantilha de ouro sob os céus?
*** ***
Biografia


E tudo ocorre na melancolia
da sílaba, o casulo emergindo
nas talhas.
Inquieta sofre a gestação
no caule dos rebentos.
O gesto da carne
no linho que lambe a mutação.
Rota, sopro, sístole ou máscara
onde bardos fecundam a sazão
da ebriedade.
E entra nas vozes,
nos hortos, algures no inabitado
onde gravitam tâmaras.
Melífaga
ironia das fábulas, a palavra
mastiga a água adubada no sangue
do amor.
Pois ser bardo e sonhador
é devorar o fogo sagrado, o correr
das chuvas.
A alma desatando-se
sílaba que afeiçoa as matizes do
espanto cheio de luz.

Então nu, já poderei morrer
inteiro, as dores exactas, na alma desolada
dos anjos abstractos em seus remoinhos.


07 março, 2008

Graça [Maria] Magalhães...


...nasceu em África a 29 de Agosto de 1963, residindo actualmente em Viseu. Encontram-se publicados os seguintes livros: Corpo de Rio [2005], e Na Memória dos Pássaros [2006]. Colaboradora em antologias e revistas literárias como Palavras de Vento e de Pedra e Oficina de Poesia, é um dos elementos do grupo de leitura denominado Sarau dos Danados.
co.autora do blogue SarauDosDanados [clique]

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1. Desbravando lábios
nas membranas transversais da pele
Seguras o peito das tardes a morrer
e levemente as costas
sobre as células de tecido
começa um baloiço de vértebras
os átomos perfurando as meias de canela
sobre metáforas rítmicas.

reinvento raízes de cimento
desmarco o malabarismo dos pássaros
regresso ao compasso contínuo
ao teor dos dias desiguais
Onde as fábricas recriam a distância
E nos tornamos reféns do tempo.


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2. Regresso me
como se o silêncio
coberto a norte
e agitando as mãos
pudesse trazer outra vez
a brisa acrílica das ondas

e pudesse emergir do inferno
regando temporais de fogo
na combustão das saudades
nos molhos de lilases castanhos

Ainda acredito nos insectos
que não mordem intervalos de pele.
e adormeço o silêncio
das tardes alagadas

Nos meus olhos escorregavas a boca
pela nuca de salsa
e eu corria a imensidão do planeta entre as mãos.


06 março, 2008

Eduardo Pitta...

...nasceu a 9 de Agosto de 1949. É poeta, ficcionista, ensaísta e crítico literário do Público. Colabora desde 1967 em publicações literárias de vária índole. A partir de 1974 publicou oito livros de poesia, uma colectânea de contos, um romance, quatro volumes de ensaio e um diário. Entre 1994 e 2005 manteve na revista LER uma coluna de crítica de poesia. Em 2002 organizou para a revista francesa Arsenal um dossiê sobre literatura portuguesa actual. Tem participado em seminários, colóquios e festivais de poesia, em Portugal e no estrangeiro, e efectuado conferências sobre poetas. Escreve todos os dias no blogue Da Literatura [http://www.daliteratura.blogspot.com]. Tudo sobre o autor em www.eduardopitta.com

OBRA

POESIA: Sílaba a Sílaba, 1974, Um Cão de Angústia Progride, 1979, A Linguagem da Desordem, 1983, Olhos Calcinados, 1984, Archote Glaciar, 1988, Arbítrio, 1991, Marcas de Água, 1999, Poesia Escolhida, 2004. FICÇÃO: Persona, 2000 [contos, ed. rev. 2007], Cidade Proibida, 2007 [romance]. ENSAIO: Comenda de Fogo, 2002, Fractura, 2003, Metal Fundente, 2004, Intriga em Família, 2007. DIÁRIO: Os Dias de Veneza, 2005.. A PUBLICAR: Língua dos Eleitos [ensaio].
autor do blogue Da Literatura [clique]
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1


Um cão de angústia progride
na cidadela sitiada

enquanto te demoras
no sorvo
no arquejo largo
no topo da saliva

enquanto te entreabro
as pernas altas
enquanto te humedeço
o musgo tenro

para te ferir com a boca
cheia de vidro moído.


Um Cão de Angústia Progride, 1979


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2


Essa gente não sabe dos corpos a linguagem da desordem.
Esboça, quando muito, pequenos gestos
periféricos.
É uma longa aprendizagem
que pouco lhes diz. Pervertem-se na ignorância
de tudo e de si mesmos e vão (sobre)vivendo com a lentidão
e o sensabor de quem de tudo desistiu.
Subsistem.
A praia que lhes sobra chega para a dessatisfação
do largo mundo.
Percurso rastreado dia a dia onde não cabem
os Melquíades da infância.

Neles, a contiguidade do desejo é vital e extemporânea: um
[vinho
resinoso e a polpa de algumas azeitonas
configuram
padrões de vida não vivida.
Assumem-se, outrossim, como a geração do martini.
Progridem de snack para snack ao sabor de liofilizadas
cerejas, outros fumos, vários palpites
gustativos.
Entre a magia do sound
e a inutilidade de alguns lances
vão auscultando um tempo de procura e
merecimento.


A Linguagem da Desordem, 1983


04 março, 2008

António Simões...








...nasceu em Beringel, Beja, a 29 de Novembro, 1934. Licenciou-se em Filologia Germânica pela Universidade de Coimbra. Escreve poemas desde os dez anos e neles fala de insectos, pedras, flores, tremuras de alma ou do vento e de outras coisas do seu abecedário de ternura. Um dia, inventou uma barca para navegar as infinitas searas do amado Alentejo de sua infância e vai por elas fora por uma fresta aberta num poema e sabe que um dia chegará às praias de luz onde nasce o dia.
Tem quatro livros de poesia publicados: Soneto de Água (1994), com introdução de Alberto Pimenta; A Festa das Letras (1995), com prefácio de Fernando J.B. Martinho; Minha Mãe Amassa o Pão (2001); e Amor é um Fogo que Arde sem se Ver e outros sonetos (Campo das Letras, Porto, 2004). Os dois primeiros são edições de autor; o terceiro foi editado pela Câmara Municipal de Beja.
É autor de uma Antologia de Poesia Anglo-Americana, (bilingue), Campo das Letras, Outubro, 2002.
Tem em preparação dois livros de poesia: Coração Visível e Poemas Circulares: Moradias e Navegações; o livro de contos: Um Caso Amuroso e outros Contos, e um livro de histórias para crianças: Os Quarentas Irmãos e outras Histórias.
Traduziu para a Campo das Letras, a partir do Inglês, livros de Andy Warhol e diversas histórias para crianças.

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TREZE MANEIRAS DE (NÃO) COLHER UMA ROSA*


I
Colocam-se as mãos à volta da rosa,
sem lhe tocar,
para lhe roubar a forma,
das pétalas ao pé.

II
Toca-se na rosa com a boca,
até nossos lábios serem pétalas.

III
Aspira-se-lhe
o perfume intensamente,
até substituir o sangue
em nossas veias por inteiro.

IV
Fecham-se os olhos,
e, como num sonho,
levamos a rosa para dentro
do nosso coração.

V
Embrulha-se a rosa no nosso olhar,
atada com os fios do vento.

VI
Atrai-se a rosa a um encontro,
num lugar secreto da nossa alma,
e não se deixa mais sair de lá.

VII
Olha-se a rosa fixamente,
e com o fio de aço do nosso olhar,
corta-se-lhe o pé.

VIII
Tira-se todo o jardim à volta da rosa,
para que ela venha até nós,
ferida de solidão.

IX
Captura-se-lhe a chama
quando a sua cor se confunde
com o poente ou o raiar da manhã.

X
Deixa-se que o crepitar da rosa
entre em nossa alma,
misturado com o sussurrar de uma seara.

XI
Faz-se-lhe uma embuscada
quando o vento da tarde
transporta o seu perfume
dum lado para o outro.

XII
Esperamos pacientemente
que se dilua no orvalho que a cobre toda,
e bebemo-la depois,
gota a gota.

XIII
Deixamos a rosa, livre, intacta,
para a podermos colher,
com a avidez dos nossos sentidos.

*o título é uma glosa do título do poema de Wallace Stevens, “Treze Maneiras de Olhar um Melro.”
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E ESSA NÃO DISSESTE


Falaste-me um dia da família,
Do nascer,
De como a árvore vive com suas folhas,
Da passagem do vento pela casa (as portas estão sempre abertas),
Trazendo e levando novas, vibrações, súbitas ternuras;
Falaste-me da folha caída, ninguém sabe como,
Sobre a peneira alva de farinha,
Um canto verde, imóvel,
Uma voz de seiva amanhecida que escorria de teus lábios entreabertos;
Falaste-me da grama de ansiedade,
Do peso tão leve e tão insuportável
Sobre a pele retesada, quase a rebentar, de tua alma;
Falaste-me do violino que tocava incessante dentro de ti
E do céu que acolhia, ávido, a harmonia de suas vibrações;
Falaste-me de tudo isso numa manhã povoada do canto dos pássaros,
Uma manhã nos campos de Louredo,
Farta e densa de cores e de sons,
Mas esqueceste que eu só entendo e aceito uma palavra,
E essa não disseste
E era amor.
O Contra Almirante do [ Riacho de Estremoz ] blogue Palácio das Varandas ( clique )

03 março, 2008

Os Poetas







Aida Monteiro gosta de pensar que sabe sapatear ao som de Frank Sinatra e que é saxofonista e que o toca pelas ruas de Lisboa, mas na verdade não é. Admiradora de Ella Fitzgerald e artista plástica aos fins-de-semana, começou a pensar nas letras com 16 anos, em 92, na varanda de um terceiro andar onde conheceu pela primeira vez a pouca distância que há entre as coisas. Hoje ainda anda na escola, mas agora a ensinar a não esquecer que o p e q trazem sempre uma mochila às costas. Aida gosta de pensar que vive de olhar voltado para o Tejo e que um dia poderá vir a ter um coração completo
autora do blogue - perfil [o] da casa, o canto das cigarras [ clique ]
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o homem demorava algum tempo
a apertar os botões todos da camisa. ele
queixava-se de uma página, a 57, agora relida
com urgência, dos pequenos detalhes do rosto
se lá tivessemos ficado a atirar objectos
para o fundo das arcas, se tivessemos compreendido
a textura nos olhos e a notícia. naquela casa
a mulher era mais rápida a sacudir as sombras
e a bater com força o tapete da rua
à janela. eu se os fechava e tinha medo
era porque imaginava o desequilíbrio de um prego
na parede. as avós encostadas e em fila
muito cansadas e à espera
pediam a deus o último suspiro
que ele viesse e as cegasse.
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a lata estava ali mesmo
à espera que o pedro corresse
um bocadinho e ganhasse coragem
para a chutar. não é preciso muita
força – gritava a susana – que observava
a agitação dos pés e dava umas dicas – mais
à direita, vai, vai, é agora, eh pá chuta na bola – dizia
o daniel do outro lado da rua. eu agora
lembro-o e não sei por quanto tempo
ficaremos assim parados. no rosto dele parecia
que as ruas não custavam a subir
mesmo quando dobrava e comprimia à pressa
a sebenta no bolso de trás das calças e
adiantava o passo, a respiração. embaciava-se o vidro
na janela do menino do 2.º esquerdo, mesmo ali
a olhar para nós e a contar o tempo que demoraria
o pai da teresa a acomodar a bagagem dentro
do automóvel.



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Falar de Bienais de Poesia sem falar de Poetas, não faz sentido...
Eis algumas brevíssimas pinceladas [ a vida dos poetas não se deve divulgar ] sobre os POETAS que intervirão em Poem'Arte//III Bienal de Poesia de Silves.